Considerado uma das maiores lendas da indústria dos games, Hideo Kojima construiu uma carreira marcada pela ousadia e pela busca constante por inovação. Criador de Metal Gear e responsável por obras recentes como Death Stranding e sua sequência, Kojima é visto por muitos como um diretor de cinema que encontrou nos videogames a mídia perfeita para transformar ideias em experiências. Sua assinatura mistura jogabilidade criativa, narrativas complexas e uma abordagem quase cinematográfica.
Nascido em 24 de agosto de 1963, em Tóquio, Kojima cresceu fascinado por filmes. Durante a infância e a adolescência, passava horas no cinema absorvendo histórias que, anos mais tarde, serviriam de inspiração para seus próprios projetos. O sonho original era se tornar diretor de cinema, mas o destino o levou por outro caminho. Em 1986, conseguiu um emprego como designer de games na Konami, abrindo as portas para uma das trajetórias mais marcantes da história do entretenimento digital.
Do Primeiro Jogo ao Sucesso de Metal Gear
Seu primeiro trabalho foi como assistente de direção em Penguin Adventure, uma continuação do jogo Antarctic Adventure. A trama girava em torno de um pinguim em busca de uma maçã dourada para salvar a princesa do reino. No mesmo período, Kojima chegou a iniciar o desenvolvimento de Lost World, estrelado por uma lutadora mascarada. O projeto, no entanto, acabou cancelado.

Em 1987, veio a primeira grande oportunidade: Metal Gear. Criado para o MSX2, o jogo colocava o jogador na pele de Solid Snake, um agente de elite enviado para destruir uma arma nuclear conhecida como Metal Gear, localizada na base fictícia Outer Heaven. Embora não tenha sido o primeiro título de stealth, foi ele quem consolidou o gênero, apresentando uma mistura inédita de espionagem, ação e narrativa cinematográfica. O sucesso abriu caminho para uma parceria de décadas entre Kojima e a Konami.
Dois anos depois, em 1989, Kojima lançou Snatcher, um visual novel que deixava clara sua paixão por histórias densas e por influências da ficção científica. Ambientado em um futuro distópico, o jogo acompanhava Gillian Seed, um detetive que enfrentava seres conhecidos como Snatchers, androides que substituíam humanos em segredo.
Já em 1990, o criador retornou à série que o consagraria com Metal Gear 2: Solid Snake. Com mecânicas mais sofisticadas, como a possibilidade de rastejar e um radar mais inteligente, o título ampliava o conceito de infiltração e espionagem. Situado em Zanzibar Land, a história aprofundava a mitologia ao redor de Snake e expandia a narrativa política e bélica que se tornaria uma marca registrada da franquia.
Metal Gear Solid e Experiências Inovadoras

O divisor de águas veio em 1998 com o lançamento de Metal Gear Solid, no primeiro PlayStation. A mistura de gráficos 3D, cutscenes cinematográficas, dublagem marcante e enredo complexo transformou o título em um clássico instantâneo. A história seguia Solid Snake em uma missão de alto risco, mas o que se destacava era a forma como Kojima explorava o potencial do console para criar experiências inéditas.
Um exemplo famoso foi o chefe Psycho Mantis, que “lia” a memória do console e obrigava o jogador a trocar o controle de porta para conseguir derrotá-lo. Outro momento emblemático era a cena de tortura, que punia automaticamente quem tentasse trapacear usando controles turbo.
Em 2001, Metal Gear Solid 2: Sons of Liberty levou essa ousadia adiante. Ao lado da jogabilidade refinada, o jogo abordava temas como manipulação da informação, fake news e questionamentos sobre a própria realidade — tópicos que só se tornariam centrais no debate público muitos anos depois. Assim como ocorreria com Death Stranding no futuro, Kojima antecipou discussões contemporâneas, colocando-as no coração de uma obra de entretenimento.

Três anos mais tarde, Metal Gear Solid 3: Snake Eater inovou novamente. Ambientado na Guerra Fria, apresentava cenários naturais como florestas, onde camuflagem, sobrevivência e combate se tornavam peças-chave. A riqueza de detalhes era impressionante: o jogador podia até queimar sanguessugas no corpo do personagem com o cigarro de Snake. O título, lançado para PlayStation 2 e depois adaptado para Xbox e 3DS, consolidou a franquia como um fenômeno cultural.
Metal Gear Solid 4: Guns of the Patriots, lançado em 2008, trouxe a conclusão da saga de Solid Snake, agora mais velho e fragilizado. A narrativa cinematográfica foi tão marcante que o jogo se aproximava mais de um filme interativo do que de um título tradicional, elemento que estaria posteriormente em outras obras do produtor.
A Ruptura com a Konami e o Recomeço com a Kojima Productions
Apesar dos sucessos consecutivos, a relação de Kojima com a Konami começou a se desgastar durante o desenvolvimento de Metal Gear Solid V: The Phantom Pain, em 2015. Divergências criativas e disputas internas criaram uma relação conturbada que afetou tanto este título quanto outras obras do diretor, culminando no rompimento de uma relação de quase trinta anos.

Logo após deixar a Konami, Kojima fundou seu próprio estúdio independente, a Kojima Productions, em parceria com a Sony. O primeiro projeto foi Death Stranding, lançado em 2019. O jogo apresentava uma proposta ousada: transformar um entregador em herói em meio a um mundo devastado por um evento apocalíptico.
A ideia partia de um conceito inspirado no escritor japonês Kōbō Abe, Bō ni natta otoko (O Homem que se Transformou em um Pau). Abe explicava, em seu conto, que o primeiro instrumento da humanidade foi o “pau”, usado para afastar ameaças, e o segundo foi a “corda”, símbolo de conexão. Segundo Kojima, a maioria dos jogos de ação representava os “paus”, com foco em armas e violência, Death Stranding queria explorar as “cordas”: os laços que unem pessoas.
No papel de Sam Bridges, vivido por Norman Reedus, o jogador precisava reconstruir conexões entre comunidades isoladas em um mundo marcado pela chuva temporal que envelhece tudo o que toca. A experiência era solitária, mas ao mesmo tempo colaborativa: escadas e cordas deixadas por outros jogadores online podiam ajudar na jornada, reforçando a sensação de que ninguém estava completamente sozinho.

A fórmula foi um sucesso e deu origem à Death Stranding 2: On the Beach, onde Norman Reedus, Léa Seydoux, Troy Baker, Guillermo del Toro e Nicolas Winding Refn reprisam seus papéis do título anterior, enquanto Elle Fanning, Shioli Kutsuna, Luca Marinelli, Alastair Duncan, Alissa Jung, Debra Wilson e Tommie Earl Jenkins se juntam ao elenco como novos personagens na trama.
On the Beach se passa onze meses após o fim do primeiro jogo, e possui foco mais amplo no combate se comparado ao seu antecessor, dando mais liberdade aos jogadores de como lidar com cada desafio. A recepção da crítica destacou as melhorias de gameplay como um aprimoramento de tudo o que foi construído no primeiro jogo, enquanto alguns ressaltavam como Kojima manteve a essência de Death Stranding, estabelecendo um título que não seria para todos os jogadores, mas que oferecia muito para aqueles que se aventuravam nos conceitos apresentados.
OD Knock: O Futuro do Terror e Novas Mídias
Se Death Stranding mostrou o lado mais experimental de Kojima, o futuro promete ainda mais ousadia. No The Game Awards de 2023, ele apresentou OD, seu novo título cujo nome é uma abreviação para overdose e um projeto desenvolvido em parceria com a Xbox Game Studios. Pouco se sabe sobre o jogo, mas o criador já deixou claro que pretende reinventar a forma como entendemos o terror.
Segundo ele, a proposta é uma antologia episódica em que cada capítulo é escrito por um autor diferente, explorando perspectivas variadas do medo. Kojima chegou a dizer que OD não será apenas um jogo, mas um “novo tipo de mídia” que o público vai “amar ou odiar”.
Concluindo
De Metal Gear a Death Stranding, passando pela fundação de seu próprio estúdio, cada passo revela Hideo Kojima como um criador que não tem medo de arriscar. Ao longo de quase quatro décadas, ele se consolidou como um dos grandes visionários do entretenimento. Seus jogos abriram portas para novos criadores explorarem caminhos diferentes. E se o passado já é grandioso, o futuro promete ser igualmente revolucionário.
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