A história dos eSports, como são conhecidos os esportes eletrônicos, até chegar ao patamar atual de indústria global, começou de forma bem mais simples, em torneios universitários e eventos isolados, tem até um filme que mostra um campeonato da década de 80 chamado O Gênio do Vídeo Game e dá uma ideia de como as coisas eram.
Hoje, quando falamos em competições de videogame, é fácil pensar nos grandes campeonatos acontecendo em estádios de futebol, transmitidos para milhões de pessoas, com premiações milionárias e jogadores tratados como astros.
Então, se você já pensou em como tudo começou e como chegamos até aqui, vamos falar sobre essa trajetória dos eSports, desde os primeiros campeonatos dos anos 70 até o gigantesco mercado que movimenta bilhões hoje em dia. Se ficar na dúvida, deixe um comentário.
Os primeiros torneios
Lá atrás, em 1972, a Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, organizou um torneio chamado “Olimpíadas Intergalácticas de Spacewar”. Era um evento entre estudantes, que disputavam quem se saía melhor no jogo Spacewar, um dos primeiros games eletrônicos. O prêmio não era dinheiro, mas uma assinatura da revista Rolling Stone, mostrando que o foco estava mais na diversão do que em uma carreira.

Oito anos depois, em 1980, a Atari, que na época dominava o mercado com seus consoles e arcades, resolveu investir em algo maior: criou o Space Invaders Championship. Esse torneio é considerado o primeiro grande evento de eSports, já que reuniu cerca de 10 mil participantes espalhados pelos Estados Unidos, um número impressionante para a época e mostra como aquilo já estava virando uma disputa séria.
Em 1990, a empresa lançou o Nintendo World Championships, que percorreu várias cidades norte-americanas e teve sua grande final na Califórnia. A ideia era juntar jogadores de diferentes lugares, testando suas habilidades em games populares da Nintendo.
Ela repetiu a fórmula em 1994 com o Nintendo PowerFest 94, que reforçou a ideia de que os campeonatos de videogame podiam atrair multidões e se tornar uma competição séria. É verdade que esses eventos ainda eram pontuais e concentrados em determinados países, mas serviram como base para a construção do que viria depois.
Já no Brasil, os campeonatos de videogame aconteciam de forma bem mais simples e quase sempre ligados a ações promocionais. Revistas especializadas como Ação Games, SuperGamePower e VideoGame organizavam disputas em feiras de tecnologia, eventos em shoppings e até em clubes, geralmente focadas em sucessos da época como Street Fighter II, Mortal Kombat e International Superstar Soccer.
Também era comum locadoras de bairro promoverem torneios de fim de semana, atraindo crianças e adolescentes para partidas de Top Gear, Mario Kart ou jogos de luta em consoles 16-bits. Até a televisão entrou na onda: programas populares como o PlayGame apresentado pelo Gugu Liberato colocavam os participantes para disputar jogos da era 8 e 16 bits, além de perguntas e respostas no estilo gincana. O programa tinha patrocínio da TecToy e os jogadores se enfrentavam em games da SEGA, como Alex Kidd in Miracle World e Sonic The Hedgehog, do Master System. A parte mais divertida ficava quando os jogadores eram transportados para “dentro” dos jogos e passavam por desafios baseados numa rom modificada do Alex Kidd.
A era das LAN houses e a expansão dos anos 90 e 2000
A década de 1990 foi marcada por uma mudança importante: a popularização dos PCs e, com eles, as LAN houses — locais onde você pagava por algumas horas de acesso à internet. Eram pontos de encontro onde adolescentes e fãs de games jogavam games como Ragnarok, Counter-Strike e outros. Muitas competições eram organizadas de forma séria, ainda que em escala local, nessas Lan Houses. No Brasil, por exemplo, as LAN houses foram fundamentais para o crescimento do cenário competitivo de Counter-Strike.
Enquanto isso, no cenário internacional, o avanço da internet acelerava o processo. No começo dos anos 2000, ainda havia poucos torneios relevantes por ano, mas com a chegada da banda larga, a barreira da distância caiu. O que antes exigia a presença física dos competidores agora podia ser feito online, e o número de competições disparou. Para se ter uma ideia, em 2000 havia pouco mais de dez torneios internacionais importantes; dez anos depois, em 2010, esse número já passava de 160.
Foi nesse período que nasceram alguns dos eventos mais importantes do mundo dos eSports, como o World Cyber Games (WCG), o Intel Extreme Masters e a Major League Gaming (MLG). Em 2002, surgiu também a G7, a primeira organização internacional voltada para os eSports, reunindo equipes famosas como a Fnatic, do Reino Unido, a SK Gaming, da Alemanha, e a brasileira MIBR, que até hoje é lembrada pela sua trajetória no Counter-Strike.

O impacto da internet e das plataformas de streaming
Se as LAN houses deram um empurrão inicial, foi a internet que realmente transformou os eSports em fenômeno global. Jogar online se tornou comum e assistir às partidas também virou parte da cultura gamer. Plataformas de vídeo e de streaming mudaram para sempre o modo como o público acompanha as competições.
A Twitch é o maior exemplo disso. Criada em 2011 a partir do Justin.tv, a plataforma passou a se dedicar exclusivamente a jogos e rapidamente ganhou espaço entre jogadores e fãs. Hoje é a maior plataforma de transmissões de games do mundo. Em 2014, foi comprada pela Amazon por quase um bilhão de dólares, mostrando o tamanho do negócio. Além dela, o YouTube também se tornou central para a difusão do conteúdo de eSports. Não só transmissões ao vivo, mas vídeos gravados, análises e até memes passaram a fazer parte do ecossistema.
Esse acesso fácil derrubou qualquer barreira geográfica e ajudou a popularizar os campeonatos. Um fã no Brasil pode acompanhar ao vivo a final que acontece na Coreia do Sul, interagindo com outros espectadores em tempo real. Relatórios mostram que o público dedicado ao YouTube chega a consumir, em média, 8,5 horas semanais de vídeos de games, mais até do que joga.
Outro ponto importante foi a chegada dos jogos mobile ao cenário competitivo. Títulos como Free Fire e PUBG Mobile conquistaram uma base de fãs gigantesca, especialmente em regiões onde o PC e o console não eram tão acessíveis. Em 2019, jogos mobile chegaram a representar cerca de 50 milhões de horas assistidas em streamings, quase dez vezes mais do que no ano anterior. Esse crescimento mostra como os eSports se adaptaram a diferentes plataformas e públicos, alcançando jovens conectados em todas as partes do mundo.
A profissionalização: ligas, equipes e grandes premiações
A partir dos anos 2010, os eSports deixaram de ser apenas diversão entre amigos e se tornaram um negócio profissional. Equipes como Fnatic, Team Liquid, SK Gaming e T1 passaram a funcionar como clubes esportivos tradicionais, com jogadores contratados, treinadores, psicólogos, preparadores físicos e centros de treinamento de ponta. Jogadores que antes sonhavam apenas em se destacar começaram a receber salários fixos, além das premiações.

Com isso, nasceram ligas oficiais que seguem modelos próximos dos esportes tradicionais. A Overwatch League, por exemplo, criada em 2018, organizou times baseados em cidades, como acontece no basquete ou no futebol. A final dessa liga pagou mais de um milhão de dólares para o time campeão. Em paralelo, ligas de League of Legends se consolidaram na Coreia (LCK), Europa e América do Norte (LEC e LCS), além do circuito mundial que leva ao famoso LoL Worlds. O Valorant, jogo da Riot Games, também ganhou seu próprio sistema competitivo global, o VCT, enquanto FIFA, Rainbow Six e outros títulos mantêm ligas fortes e seguidas por milhões.
As premiações acompanharam esse crescimento. O exemplo mais famoso é o The International, campeonato mundial de Dota 2 organizado pela Valve. A edição de 2021 bateu recordes, com premiação total de 40 milhões de dólares, algo impensável até para muitos esportes tradicionais. O Campeonato Mundial de League of Legends também distribui milhões em prêmios e reúne audiências que chegam a bater recordes de transmissão ao vivo. Outro marco foi a Fortnite World Cup de 2019, que pagou 30 milhões de dólares, consolidando o Battle Royale como um gênero competitivo de respeito.
Com tanto dinheiro circulando, os patrocínios se tornaram parte essencial do ecossistema. Empresas de tecnologia como Intel, NVIDIA e Samsung, marcas de energia como Red Bull e até montadoras passaram a investir pesado em equipes e eventos. Estima-se que hoje o patrocínio e a publicidade representem mais da metade de toda a receita dos eSports. Algumas empresas chegaram a criar espaços dedicados ao tema, como a Newegg, que em 2025 inaugurou em sua sede o Newegg Gamer Zone, um espaço voltado a eventos e treinos.
O cenário atual e o futuro
Hoje, os eSports são um fenômeno consolidado. Em 2024, a audiência global chegou a cerca de 611 milhões de pessoas, somando fãs ocasionais e espectadores dedicados. A maior parte desse público tem entre 16 e 35 anos, mostrando que é um setor fortemente ligado à juventude, embora a participação feminina venha crescendo e já represente mais de um terço da audiência total.
A região da Ásia-Pacífico concentra a maior fatia desse mercado, com aproximadamente 57% dos espectadores. China, Coreia do Sul e países do Sudeste Asiático são verdadeiras potências, tanto em público quanto em times e jogadores. Europa e América do Norte também têm peso, respondendo juntas por quase 30% da audiência. Já o faturamento global em 2024 ficou em torno de 1,6 bilhão de dólares, com previsão de crescimento anual acima de 15% nos próximos anos. Projeções indicam que, em 2025, os Estados Unidos devem ultrapassar a China em receitas, chegando a mais de um bilhão de dólares.
Conclusão
Em pouco mais de cinquenta anos, os torneios de videogame passaram de encontros universitários modestos para arenas lotadas e transmissões com milhões de espectadores. Os fatores que explicam esse crescimento são claros: o streaming de vídeo, que aproximou público e jogadores; os patrocínios milionários, que sustentam equipes e eventos; e o mercado de apostas, que cresce em paralelo e já movimenta centenas de milhões. Além disso, a presença dos eSports em eventos como as Olimpíadas, ainda que em caráter demonstrativo, dá mais legitimidade à modalidade.
Hoje, os eSports são mais do que um passatempo: são uma indústria global, que movimenta bilhões, emprega milhares de pessoas e atrai cada vez mais a atenção de empresas, governos e do público. Se o começo foi tímido, o futuro parece cada vez mais promissor para quem vive e respira esse universo.
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